CRÍTICA“Bailarina” – Mécanosphère

Vital.
“Bailarina” é um disco maquinal, sobrevivente de um equilíbrio entre uma poesia vinda de nenhures e uma pujança sonora densa, desconcertante, rumo a um infinito. Respira a máquina, respira-se uma máquina de batimento cardíaco incessante – Scott “Sikhara” Nydegger.
Surgem quadros surreais na voz de Adolfo – Adolfo Luxúria Canibal. Pinturas sombrias a historiar cenários de vida e de morte, daqui e do além. Às vezes saltam zombies a compassso entre as rodas de um rolls royce numa dança sombria, interminável. Quadros surreais de um Adolfo inspirado, de uma bailarina que dança num compasso industrial, num batimento maquinal. Infernal.
Sente-se a corrente sanguínea em flashes imagéticos que transbordam a realidade, tal a amplitude da arte amplificada. Há uma máquina sempre em rotação, num batimento constante e controlado. Desconcertante.
Menos industrial, menos sufocante e mais teatral, histórico, fruto de uma realidade ao tempo tornada irreal, mais, surreal. A espaços ouvimos o regresso de um forte sentido maquinal de Benjamin Brejon, num arrepio sombrio que nos enleia de novo naquele batuque descontrolado e enrolado em vozes distantes em sofrimento. E o martelo martela, sobre berros assustadores. E a máquina dura. A máquina luta. E a história continua, marcada pela voz roucamente contorcida de um Adolfo contador. Contador de histórias de choque. Reais. Às vezes, enquanto a chuva cai sobre os postes eléctricos. E o coração vai batendo, forte, como o vento norte.
Depois, e depois levantamos voo, novamente em sofrimento, implacável, num sonoro sofrimento distante enquanto o rugido das máquinas aproveita mais uma vez para nos entorpecer e embalar num registo contínuo. As máquinas, os músicos, os instrumentos. Há toques de sofrimento – LePiloteRouge. Batidas de prazer. Estocadas.
E as histórias continuam, numa procura incessante de salvação num ritmo tribal até ao fim…Inventaire.
É um disco louco, saudavelmente louco.

“Bailarina” – Mécanosphère (2004/Independent Records)

01 Despertar
02 Bailarina
03 Engenhos
04 Testes
05 Retour de Manivelle
06 Mécanosphère
07 Tempo dos Astronautas
08 Algébrica Celeste
09 Voo
10 Corre
11 Inventaire

Sítio: www.mecanosphere.net

By Rui Dinis

Rui Dinis é um pai 'alentejano' nascido em Lisboa no ano de 1970, dedicado intermitentemente desde Janeiro de 2004 à divulgação da música e dos músicos portugueses.