Actualizando o sentido das palavras de Al-Mu’tamid, um conjunto de músicos e intérpretes cantam os seus poemas nas línguas dos três países herdeiros do legado andalusino: Filipe Raposo, Janita Salomé e Quiné Teles de Portugal; Eduardo Paniagua e Cezar Carazo de Espanha; El Arabi Serghini e Jamal Ben Allal de Marrocos.
Al-Mu’tamid Ibn Abbâd é considerado o mais brilhante poeta do Al-Andalus no Séc. XI. Nasceu em Beja em 1040 e foi príncipe regente em Silves, ambas as cidades hoje situadas em território português. Entre 1069 e 1090 foi Rei da Taifa de Sevilha, sucedendo a Al-Mu’tadid, seu pai. Após ter sido destronado em 1091 pela dinastia Almorávida, que passou a controlar todo o Sul da Península Ibérica, foi primeiro exilado em Tânger e depois levado para Aghmat, 18 km a Sul de Marraquexe, Marrocos, onde passou os últimos anos da sua vida, preso e desterrado, acabando por falecer, na maior das misérias, em 1095.
O que é especial na sua condição de poeta é ter sido também Rei, o que naquela época lhe permitiu escrever com grande liberdade e ao longo de toda a sua vida, mesmo depois de destronado, sobre ele próprio e o mundo em que viveu; e de forma tão aberta que chegamos a pensar poder estar a escutá-lo agora, intemporal, segredando-nos à luz da contemporaneidade, as questões mais essenciais do ser. É essa a razão porque as suas palavras ainda hoje, passados dez séculos, nos tocam profundamente, dando-nos a partilhar a sua intimidade e presença de espírito, envolta em sensibilidade, sensualidade e paixão por viver.
A edição deste CD é o segundo dos resultados de um projecto artístico mais vasto, que inclui o concerto deste reportório, encenado cinematograficamente e estreado no dia 15 de Janeiro de 2014 no Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa, e ainda a ideia de realizar um filme documentário. O projecto tem como principal objectivo iluminar no presente uma entidade territorial e cultural – o Al Andalus – através da vida e da obra do Poeta Rei.
A partir de uma ideia original de Carlos Gomes, realizador e arquitecto, e do convite que este dirigiu a Filipe Raposo, pianista e compositor, para assumir a direcção musical do projecto, foram convidados vários músicos portugueses, espanhóis e marroquinos para comporem músicas originais a partir de poemas de Al-Mu’tamid, cantados em cada uma das línguas dos 3 países que hoje integram o território geográfico de maior influência do Al-Andalus: Portugal, Espanha e Marrocos.
O concerto e a gravação do CD reúnem as músicas originais que resultaram do processo criativo entre os músicos, oriundos dos três países sobre a poesia do Poeta Rei; mas também integram alguns temas já anteriormente gravados, agora com novos arranjos, que pela sua qualidade e relação com os demais, atribuem um particular sentido a este voltar a ouvir e olhar para aquilo que são os sinais claros de uma herança cultural comum, assim valorizada com a nota pessoal dos seus autores e com o lastro do seu percurso musical na relação com as tradições e formação de cada um.
Num tempo em que se assiste a fortes clivagens culturais e religiosas, alimentadas por velhos e novos conflitos político-territoriais, é particularmente pertinente reavivar os valores de um legado cultural que deve a sua longevidade precisamente à diversidade de povos e culturas, religiões e cultos, tradições e costumes, tecidos ao longo de séculos de convivência, de cruzamento, de mistura e de reciproca influência.
Próximas actuações:
Cineteatro Municipal João Mota, Sesimbra 13 de Março, 22h00
FNAC Chiado, Lisboa 14 de Março, 17h00
https://vimeo.com/121840292