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A Trompa n’O Sol da Caparica 2015

Rui DinisRui Dinis

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O maestro regressou este ano à Caparica e o sol não faltou…com algum vento à mistura. Um ano depois, o maestro voltou ao Sol da Caparica para confirmar a maioridade de um festival lusófono que se quer para todas as idades e para todos os gostos. Isso, está confirmado. Sobre o resto e vou já avisando, é natural que o azedume seja maior que o habitual.

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Dia 1
Chegar e não chegar, comprar o bilhete, o apalpanço da GNR, pôr a pulseira e lá foram os concertos de Mimicat, Dengaz, HMB e Camané. Também não interessa muito porque o que se seguiu compensou tudo o resto, o que passou e o que ainda estaria para vir. Falo do show de Legendary Tigerman, na sua versão upgrade rock’fuckin’roll, com Paulo Segadães na bateria, Filipe Costa nas teclas e João Cabrita no saxofone barítono; repito, João Cabrita no saxofone barítono. Excelente presença do saxofonista nos duelos constantes e explosivos com Paulo Furtado. Logo no início e o dia já estava ganho. Espreitei Resistência e foi apenas isso, espreitei. Nunca fui grande fã destes projectos de recauchutagem musical mas sabe sempre bem voltar a ouvir algumas dos temas mais importantes da música popular portuguesa. De saudar também a enorme solidariedade entre músicos. Percebo pouco de música mas imagino que seja mais essa a razão para o colectivo precisar de sete guitarras de vários tipos em palco. Voltando ao palco menor, os UHF estavam a jogar em casa. Sem golearem, fizeram o que tinham para fazer e saíram vitoriosos da contenda. Basta a menina estar à janela a ver os cavalos de corrida descerem pela Rua do Carmo, que o resultado será sempre positivo. Também a jogar em casa, mas no palco maior, Carlão pareceu cumprir com os mínimos olímpicos. Não vi tudo e o que vi também não me alegrou por aí além. Marcelo D2 passou-me ao lado, lamento. Deu para perceber apenas a boa onda do dueto com Dengaz no “Tamojuntos”. Richie Campbell fechou a noite com uma espectáculo musicalmente competente mas aqui e ali algo repetitivo e até aborrecido. Não sei se fechar o palco principal com um artista reggae já com alguma projecção mas ainda poucos hits, tenha sido uma boa opção. Não me parece. Tenho muita pena de já não ter assistido a DJ Marfox. Muita, mesmo.

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Dia 2
Lamento Dino D’Santiago mas não deu para chegar a tempo. A Brigada Victor Jara cumpre sempre. O povo ainda era escasso em redor do palco menor mas o grupo tratou de fazer a festa com quem estava presente. E o público, cada vem em maior número, foi entrando na dança, fazendo a festa num concerto entremeado com as habituais mensagens políticas. Foram excelentes os O’queStrada, liderados pela enorme performer Miranda e ainda com o último “AtlanticBeat: Mad’in Portugal” para se ouvir alto e bom som. No palco maior e em pequenas espreitadelas, a correria não dava para mais, percebeu-se que o angolano Paulo Flores rapidamente agarrou o povo com os seus ritmos africanos e que Vitorino & Son Habanero, não subiria à Costa da Caparica para ir apenas à praia. Grandes artistas, grandes espectáculos. PAUS e Linda Martini fecharam a noite no palco menor, com as novas sonoridades de que é feito o actual rock português. Primeiro PAUS, num concerto sempre explosivo, talvez o mais interessante que passou por aquele palco naquela noite. As dinâmicas são conhecidas e ao vivo, o conjunto ganha toda uma orgânica difícil de perceber por vezes nos discos. Excelente. Já sobre Linda Martini e não tendo sido um concerto absolutamente inesquecível, o grupo acabou por cumprir e bem com o desejado. Dar a ouvir o que o público quer ouvir num festival deste tipo. E foi exactamente isso que Jorge Palma fez em toda a largura – não ouvi Tim. Com um alinhamento escolhido a dedo e acompanhado por uma banda insuperável, Jorge Palma deu claramente o concerto da noite. Tema após tema, todos eles hits do músico, sem esquecer os mais recentes “Imperdoável” e “Encosta-te a Mim”, a noite de Jorge Palma foi de absoluta magia. Grande concerto, a merecer fechar a noite. Já sobre Paulo Gonzo fiquei com muitas dúvidas. Desde logo, se tem perfil para fechar uma noite destas. O seu alinhamento, a sua postura, parece-me claramente a de um artista mas adaptado a espectáculos de casino e menos a multidões de 15.000 ou 20.000 pessoas. Ainda que tenha naturalmente passado pelos seus êxitos planetários, o excessivo uso de versões confirma mais uma vez o que disse antes assim como algumas fragilidades em termos de alinhamento. A idade não perdoa e Mastiksoul teve de ficar para outras núpcias.

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Dia 3
O terceiro dia começou com uma pequena multidão em redor do palco menor, para ouvir Berg, o grande vencedor do programa Factor X da SIC mas já músico experiente e com vários discos editados. Não pude ver todo o espectáculo mas pelo que vi, pareceu-me um início de dia muito, muito positivo. Desta vez e para ouvir Tiago Bettencourt, tive de passar Tito Paris. Sobre Tiago Bettencourt, o arranque foi muito frouxo, com o músico a tocar músicas apenas para as primeiras filas. Num festival e mesmo sabendo que não há fórmulas certas para isto, talvez seja interessante não demorar muito tempo até apresentar um dos hits mais conhecidos. Para quem tinha apenas 45 minutos, Tiago Bettencourt demorou muito tempo a chegar lá. Mesmo eu, que respeito a música de Tiago Bettencourt, estive quase a desistir. Resolvida a questão, todo o resto do concerto foi muito mais ligado, particularmente na relação artista-público. De seguida, foi com alguma ansiedade e até entusiasmo que me preparei para conhecer o fenómeno infanto-juvenil chamado AGIR. E acreditem, era grande a multidão em redor do palco menor. Pais, jovens e crianças, era tudo a pedir AGIR. No fim, com alguma tristeza mas sem qualquer surpresa, ficou a desilusão; uma grande desilusão. Nunca percebi, até àquele dia, que AGIR não cantava, que era apenas um animador, que pulava bastante, que gritava para direita e para esquerda, que chamava muito pelo people e lá dizia de vez em quando umas palavras ao microfone. Foi mesmo estranho, em todo o caso, a banda estava em palco, alguém cantava e a magia aconteceu. Aquilo é que foi festa. Para fechar o palco menor, um nome maior do hip-hop nacional. Boa presença de Regula e do seu novo “Casca Grossa”. O “Toni do Rock” está aí para as curvas. Voltando ao palco maior e do que vi, Luís Represas e Miguel Araújo cumpriram claramente com o esperado. Com um alinhamento naturalmente mais solidificado, fruto dos muitos anos de carreira, Luís Represas não desperdiçou a oportunidade de fazer vibrar os milhares de pessoas que o foram ver e ouvir. Espectáculo competente. O mesmo se passou com Miguel Araújo, ainda que com um alinhamento naturalmente mais frágil. Uma boa banda e uma piscadela ao “Pica do 7”, tema que Miguel Araújo escreveu para António Zambujo, ajudaram claramente à festa. Já quase no fim, tempo para um grande espectáculo mas claramente perdido no espaço. Se já parecia estranha a inclusão de Batida no alinhamento entre Miguel Araújo e Xutos & Pontapés, a realidade veio infelizmente  a comprová-lo. Nada a ver com Batida, que deram um extraordinário espectáculo de música, dança e intervenção política, mas o palco maior e o ambiente inesperado, tornaram estranha a apresentação do projecto de Pedro Coquenão. Por fim, estavam 25.000 à espera dos Xutos & Pontapés. Nem me vou alongar, foram iguais a si mesmos. O grande espectáculo do festival. DJay Rich e António Mendes também vai ter de ficar para a próxima.

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Rui Dinis
Author

Rui Dinis é um pai 'alentejano' nascido em Lisboa no ano de 1970, dedicado intermitentemente desde Janeiro de 2004 à divulgação da música e dos músicos portugueses.