É um registo curioso, até por isso espantoso.
Não é um disco musicalmente fantástico, os anos 60 nunca o permitiriam (tecnicamente, politicamente, etc.), é acima de tudo um registo maravilhoso e historicamente representativo desse culto. O culto Beatles em Portugal, aqui demonstrado num documento kitsch, ingénuo e imaturo quanto apaixonante; um documento extraordinário, também ele representativo de um Portugal triste, vazio, limitado pelo traço imperdoável do lápis azul e pela rusga policial.
Uma palavra de apreço para o artwork de mackintóxico e para o excelente texto de Luis Pinheiro de Almeida.
A compilação é de 2004 e veio parar à colecção do mestre por 1€, novo.
Indescritível.

01 Duo Ouro Negro – “Agora Vou Ser Feliz” (“I Wann Hold Your Hand”), um dos momentos altos da compilação, a versão de Raúl Indipwo e Milo Mack-Mahom foi mesmo citada na Billboard.
02 Pop Five Music Incorporated – “Ob-La-Di Ob-La-Da”, tema histórico – como quase todos – lembra-me como eram engraçados os bailaricos nos anos 70-80…
03 Conjunto Mistério e Fernando Concha – “Sem Ti Não Sei Viver” (“I’ll Get You”), conjunto percursor do yé-yé nacional, tem nesta versão de 64 da autoria de Fernando Concha uma imagem do quão básica era produção da altura. Curiosa também.
04 Conjunto Universitário Hi-Fi – “I Call Your Name”, estudantes de Coimbra; das vozes de Ana Maria e Carlos Correia (futuro guitarrista de Zeca Afonso) sairia uma das versões mais bem conseguidas do disco.
05 Guitarras de Fogo – “Seguirei o Sol” (“I’ll Follow The Sun”), mais do que as “réplicas”, efectivamente são as versões que mais nos divertem e esta é dessas…
06 Sheiks – “Michelle”, mais saídos da casca, a “Michelle” dos Sheiks é dos temas mais bem conseguidos…pertinho do espírito.
07 Night Stars – “Eu Sei” (“I’ll Be Back”), sofrível, já baseada numa versão brasileira.
08 Conjunto Académico Os Espaciais – “When I’m 64”, com Toni Moura (Psico e Tantra) ao leme, esta é uma das tais “réplicas”…divertidas e até bem conseguidas.
09 Jotta Herre – “Penina”, composta em 68 por Paul McCartney especificamente para os Jota Herre, é a raridade do disco. O grupo cumpre, a letra quase não sai do mesmo sítio: “Penina…Penina…One night…
10 Simone de Oliveira – “Yesterday”, escrita também em Portugal por Paul McCartney, em 65, é sem sombra de dúvidas uma das melhores canções da compilação; qualquer coisa entre o clássico e o falsete. Curiosa reivenção.
11 Carlos Bastos – “Hey Jude”, hilariante, hilariante, hilariante…cem vezes hilariante. “Hey Jude” versão fado vadio, só ouvido. Na guitarra estava António Chaínho.
12 Pop Five Music Incorporated – “Blackbird” , sem dificuldades, boa “réplica”…
13 Conjunto Sousa Pinto – “Here There and Everywhere”, mais um conjunto típico com uma interpretação típica, aqui apenas instrumental, sem nada de especial a ressalvar senão a presença do ex: ministro José Lello no conjunto.
14 Os Cinco Bambinos – “Eu Chamo Por Ti” (“I Call Your Name”), realmente desconhecidos, este é um dos temas que mais me agradou, “Eu chamo por ti, mas tu não vens…eu sou bom rapaz…trálálá”. Versão de António Leitão.
15 Diamantes Negros – “Quero-te Sempre a Meu Lado” (“I Don’t Want To Spoil The Party”), numa versão de Júlio Ribeiro, este é mais um daqueles documentos que traz consigo a expressão musical de uma época…
16 Carlos Mendes – “Penina”, instrumentalmente bem mais conseguida que a dita original…dos Jota Herre.
17 Quarteto 1111 – “Ode To The Beatles”, de 1971, é a excelente homenagem à banda de Liverpool. Muito bom.


“All You Need Is Lisboa” – Vários Artistas (2004/EMI)

By Rui Dinis

Rui Dinis é um pai 'alentejano' nascido em Lisboa no ano de 1970, dedicado intermitentemente desde Janeiro de 2004 à divulgação da música e dos músicos portugueses.