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É a “Casa Para Pássaros” dos Pernas de Alicate, faixa a faixa

Rui DinisRui Dinis

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E eis que a “Casa Para Pássaros” chega mais uma vez até uma “casa” bem perto de nós. Vai ser dia 15 de Novembro (Sábado) pelas 17h00, no Adamastor Studios, na Praça dos Restauradores em Lisboa. É uma matinée com a curadoria de Pernas de Alicate. Até lá, aqui fica o faixa a faixa do projecto de Carlos BB e Sara Feio.

MOSCA //

Mosca, a música (Carlos BB) // É o primeiro tema do projecto Pernas de Alicate, e a minha primeira aventura pessoal como produtor e músico ao mesmo tempo.
Tal como o insecto a música é irrequieta, passa daqui para ali a voar, sempre em constante movimento. É uma música dançável e harmoniosa mas também dissonante.
Acho que a música reflecte também a forma como eu me sentia a entrar neste novo projecto, cheio de vontade de fazer algo novo e mega excitado por estar a produzir a minha própria música, mas também um bocado assustado e ainda desorganizado. A certa altura do campeonato perdi a noção da quantidade de vozes diferentes que foram gravadas, foi o caos.

Mosca, o video (Sara Feio) // Quando abordei a Raquel Claudino disse-lhe que queria as pernas e a coreografia dela neste video. Enviei-lhe ideias para um fato que tapasse o resto do corpo e ela tratou da narrativa e da concepção do fato. Convidou o Filippo Maria, realizador italiano sediado como ela em Londres e foram filmar para uma floresta nos arredores da cidade – por azar na altura em que estavam a filmar houve um nevão que acabou por atrasar as filmagens e não foi nada simpático para os pézinhos da Raquel – aliás, mesmo sem o nevão, correr descalça na floresta não é para meninos.
O video conta a história duma criatura que nasceu em cativeiro e foge à procura de outros iguais a ela. Quando chega ao habitat natural da sua espécie não corre como imaginava, eles vêem-na e estranham-na. A criatura acaba por fugir assustada, e volta derrotada para o que lhe é familiar: a galeria onde pertence.
Quase que podia ser a história de alguém que emigrou e acabou por voltar para o país de origem…

BARBA //

Barba, a música (Carlos BB) // É uma música com uma forte influência de música quente, brasileira e africana. Apeteceu-me fazer uma viagem com muitas cores e com muito andamento, algo que desse vontade de dançar mas ligeiramente mais dark.
Não houve grande preocupação em que a estrutura musical fizesse sentido, o desafio era pôr vozes pop em cima de uma estrutura frenética e barulhenta. Quis fazer uma coisa barulhenta soar harmoniosa juntando mundos contrastantes e fazê-lo soar bem. Acho que queria provar a mim próprio que era possível.
Peço sempre aos músicos para gravarem coisas a mais quando participam neste projecto para que eu depois possa fazer corte-e-costura mais tarde, mas neste caso acho que exagerámos um bocadinho e só quando fui a misturar a música é que reparei que já íamos em mais de 150 pistas gravadas! É uma estupidez, mas simplesmente deixei-me levar pela minha mania das grandezas.

Barba, o video (Sara Feio) // Estava mortinha para colaborar com o Dickon Knowles, o humor negro dele é semelhante ao meu. A história foi-se criando em conjunto conforme aquilo a que tinhamos acesso mas já com a ideia de que iria haver muita experimentação na pós-produção digital com elementos sci-fi.
Foi filmado em Portugal entre a Póvoa de Santa Iria para os cenários pós-apocalípticos, a casa do Shela na Assafora, e a praia do Meco. Quem sofreu mais (porque alguém tem sempre de sofrer nos videos de Pernas) foi o Bibi que passou 1 hora deitado de barriga para baixo numa estrada de terra batida, com chuva torrencial, e a Sofia (protagonista) que durante os 3 dias de filmagens fez de tudo, desde comer comida enlatada picante a andar por fábricas abandonadas cheias de lixo… mas fê-lo sempre divertida e cheia de energia.
Quando o video/música saíram alguém num blog de música escreveu que o video era inspirado no The Road, mas acho que foi só por ser o único exemplo de que se lembraram, na verdade não foi… no The Road a criança é frágil e näive, enquanto que na Barba a personagem é dura e independente e usa o ar de criança inocente para sobreviver.

PÁSSAROS //

Pássaros, a música (Carlos BB) // Esta é a primeira música de várias que vão funcionar à volta de temas. Neste caso o tema é ‘Casa Para Pássaros’.
Foi a primeira vez em quis ter mais contacto com a electrónica e com a samplagem, algo que até aqui ainda não tinha explorado. O propósito deste projecto é mesmo esse, a experimentação pessoal e a troca de ideias com outros, e eu gosto de ter desafios.
Até agora esta é a música mais pessoal que alguma vez fiz, fala dum forte e recente acontecimento na minha vida e foi um exorcismo, ou um ‘seguir em frente’ onde abordei um tema que não queria abordar na “vida real”, para curar feridas: a morte dos meus avós.
Por essa razão tinha também algo a dizer no que dizia respeito à letra da música que foi escrita em colaboração com o Miguel da Bernarda de maneira a que as palavras fossem ao encontro do que eu estava a sentir e que se fundisse com o tom da música.
É uma música que fala de um grande amor entre duas pessoas e de uma vida toda ela vivida em conjunto, fala do momento em que uma morre e a outra não consegue superar a perda acabando por morrer também, “como os passarinhos” como diz a Sara, ou como aquela espécie de periquito gigante ‘Lovebird’.

Pássaros, o video (Sara Feio) // Foi o primeiro video que realizei e onde pude explorar mais a parte visual aliada à ilustração com máscaras feitas à mão por mim, mais alguns props feitos em papel e com as criações da Lea Magui Louro nas maquilhagens da expansão mental.
Como sabia que a música era muito pessoal para o Bibi decidi seguir o mesmo caminho, falar sobre amor mas outro tipo de amor – falar das decepções e máscaras que usamos nas nossas relações, e do impacto da honestidade nas mesmas. Acabei por usar uma versão adulterada (fica o trocadilho) da Fábula de Esopo ‘Corvo e a Raposa’ porque encaixava mesmo bem. Apesar de eu não gostar de queijo.

Rui Dinis
Author

Rui Dinis é um pai 'alentejano' nascido em Lisboa no ano de 1970, dedicado intermitentemente desde Janeiro de 2004 à divulgação da música e dos músicos portugueses.